
Anorexia Infantil
É muito comum escutar, no consultório pediátrico, mães se queixando de que seus filhos não comem. Mas até que ponto essa queixa é normal? Quando essa inapetência da criança faz parte de etapas do seu desenvolvimento normal em direção a sua independência e quando se trata de uma doença?
Diante de uma queixa "meu filho não come", a primeira observação do pediatra deve ser em relação ao peso da criança. Encontra-se com mais frequência crianças com o peso ideal para a sua idade e até mesmo com sobrepeso. Se a observação mostrar uma evolução do peso em relação à altura menor do que a esperada nas curvas de crescimento, trata-se de uma anorexia verdadeira. Caso a criança apresente um crescimento e desenvolvimento normais, trata-se de uma falsa anorexia, que traduz a preocupação excessiva dos familiares em querer impor superalimentação.
Segundo dados norte-americanos, 10 a 25% das crianças tem algum transtorno alimentar. Dentre esses transtornos, encontra-se a anorexia infantil, no qual a criança não consome, espontaneamente, a quantidade suficiente de alimentos necessária para assegurar seu crescimento e desenvolvimento adequado. Usualmente, a anorexia é mais comum em mulheres e tem início no começo da adolescência. A idade considerada crítica se dá na faixa dos 13 aos 18 anos, período no qual a recusa alimentar muitas vezes se inicia na forma de guloseimas e refrigerante, sendo associada a um intenso medo de engordar e a demonstrações de preferência pela magreza extrema.
Além disso, relaciona-se a um distúrbio de imagem corporal, o que muitas vezes faz com que a pessoa se perceba mais gorda do que realmente é, intensificando sua perda de peso e fixando metas em níveis cada vez mais baixos. Sintomas depressivos, retraimento social, irritabilidade e insônia frequentemente estão presentes nos casos de anorexia nervosa. Também há constante preocupação com relação ao comer em público e um medo exagerado de engordar, o que gera um interesse especial pelo valor nutricional de cada alimento.
Os critérios diagnósticos para anorexia nervosa são: recusa a manter o peso corporal igual ou acima do valor mínimo normal adequado à idade e à altura; medo intenso de ganhar peso ou engordar, mesmo estando abaixo do peso normal; alteração da percepção do peso ou silhueta corporais, exagero de sua importância na auto-avaliação ou negação do perigo que comporta o baixo peso corporal; nas mulheres pós-menarca presença de amenorreia, por exemplo, ausência de pelo menos três ciclos menstruais consecutivos.
É fundamental a detecção precoce dos transtornos alimentares, pois quanto mais precoces as intervenções terapêuticas, melhor será o prognóstico em longo prazo. O pediatra deve, portanto, estar atento para detectar as primeiras manifestações desses transtornos. Nas consultas de rotina, deve: averiguar os padrões alimentares em pré-adolescentes ou adolescentes e a satisfação com a aparência do corpo; aferir peso e estatura e colocá-los em gráficos, já que a desaceleração na curva do peso pode ser a primeira pista para o diagnóstico.
Muitas adolescentes demonstram preocupação excessiva com o peso, mas esta observação isolada não é suficiente para o diagnóstico de um transtorno alimentar. No entanto, essas adolescentes têm sete vezes mais chances de desenvolver um transtorno alimentar e devem ser acompanhadas com atenção. Sabe-se que as pacientes com transtornos alimentares tendem a esconder os sintomas de sua doença, o que pode oferecer problemas para o diagnóstico precoce. Os pais também podem negar o problema. Diante de um caso suspeito, o pediatra não deve sentir-se absolutamente seguro quando pais ou pacientes negam os sintomas.
Enfim, é muito comum a preocupação dos pais com a alimentação de seus filhos, mas deve-se ficar alerta a comportamentos que instiguem um cuidado adicional, procurando orientação médica sempre que necessário. Casos que não se tratam de superproteção familiar e são de fato transtornos alimentares precisarão de um tratamento amplo e prolongado, que em situações graves podem exigir internação hospitalar, acompanhamento nutricional e psicológico (individual e familiar), na tentativa evitar recaídas.
Texto: Camila C Carvalho
Referências:
MADEIRA, Isabel R.; AQUINO, Leda A.. Problemas de abordagem difícil: "não come" e "não dorme". J. Pediatr. (Rio J.), Porto Alegre , v. 79, supl. 1, p. S43-S54, June 2003 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0021-75572003000700006&lng=en&nrm=iso>. access on 28 Apr. 2015. http://dx.doi.org/10.1590/S0021-75572003000700006.
GRILLO, Eugênio; SILVA, Ronaldo J. M. da. Manifestações precoces dos transtornos do comportamento na criança e no adolescente. J. Pediatr. (Rio J.), Porto Alegre , v. 80, n. 2, supl. p. 21-27, Apr. 2004 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0021-75572004000300004&lng=en&nrm=iso>. access on 28 Apr. 2015. http://dx.doi.org/10.1590/S0021-75572004000300004



